Este conceito não tem a ver com IA defeituosa ou maliciosa, mas sim com o impacto silencioso e potencialmente corrosivo que essas tecnologias podem ter sobre nossa capacidade de pensar, lembrar e raciocinar.

Leia também

Bem-vindo ao debate sobre a IA degenerativa – o lado da tecnologia que você não sabia que precisava entender.

O que é a IA degenerativa?

IA degenerativa é um termo provocativo para descrever o fenômeno de dependência excessiva de tecnologias que nos tornam mais ivos mentalmente.

Pense na sua relação com o Waze, o Google Maps ou mesmo a boa e velha calculadora. Eles nos poupam tempo e esforço, mas, ao mesmo tempo, roubam de nós a prática de habilidades básicas como orientar-se, calcular ou até mesmo lembrar números de telefone. Eu não sabia muitos caminhos e ruas, mas agora com o Waze, eu não sei nada! Alguém aí sabe a fórmula de Bhaskara?

Um estudo da Universidade de Stanford descobriu que 92% das pessoas que usam apps de navegação frequentemente não conseguem se orientar sem eles. Outro estudo da Universidade de Oxford mostrou que 83% dos adultos não lembram o número de telefone de amigos próximos. Essas são evidências de como nossa memória está terceirizada para dispositivos.

Agora, imagine um cenário onde a IA não apenas facilita tarefas simples, mas toma decisões por você, sugere soluções e, eventualmente, faz você questionar menos. Aí reside o perigo degenerativo: a perda do pensamento crítico.

Portanto, este não é um texto que fala de uma ameaça tradicional que vemos da IA por aí, sobre a revolta dos robôs, a Skynet do "Exterminador do Futuro", ou as super inteligentes dos filmes como "Ela" ou "Ex-Machina". É sobre uma conveniência que pode exterminar o nosso pensar. E não que estivéssemos pensando muito hoje em dia, hein!?

Memória, raciocínio e pensamento crítico: as primeiras vítimas

Desde os tempos das tabuadas decoradas até a capacidade de ler mapas, nossa cognição sempre foi moldada pelo aprendizado ativo. Quando uma ferramenta assume essas funções, nós, gradativamente, desaprendemos.

Por exemplo, pesquisas de Harvard indicam que 85% dos estudantes do ensino fundamental já não conseguem resolver divisões simples sem uma calculadora. Outro dado alarmante: 95% dos adultos dependem de calculadoras para calcular gorjetas ou dividir contas em restaurantes. O que começa como conveniência pode rapidamente se transformar em dependência.

É fato: tudo aquilo que você não usa, você perde.

O perigo se intensifica com a IA mais sofisticada, como o ChatGPT ou sistemas de recomendação de conteúdo. Embora incríveis, essas ferramentas podem nos afastar da necessidade de formular opiniões ou avaliar criticamente as informações recebidas. Afinal, se a máquina parece sempre saber melhor, para que pensar?

Degenerando ou evoluindo?

É importante notar que a tecnologia não é inerentemente ruim. A historiadora Lúcia Helena Galvão argumenta que as máquinas não tomam nossos lugares; elas assumem as funções que lhes cabem. Assim como o advento do automóvel não acabou com a caminhada, mas mudou como e por que caminhamos, a IA pode nos levar a um novo patamar de pensamento.

Talvez a IA venha ressignificar o propósito do nosso fazer. Se você faz cálculos estratosféricos hoje, sem uma calculadora, é porque você quer, não por que precisa. E isso muda os porquês, os meios e ressignifica os fins. É como ouvir disco de vinil hoje em dia, você tem mais qualidade de som em outros formatos, mas curte fazer como algo vintage.

Agora, imagina se o pensar ficar vintage? Estamos perdidos.

Mas para ficarmos mais tranquilos, é preciso entender que também existe uma transferência de onde estamos colocando nossa energia.

Essa evolução exige que tenhamos consciência sobre como usamos a tecnologia. Ferramentas como ChatGPT devem ser vistas como extensões do pensamento humano, não substitutos. Se você pergunta algo e aceita a resposta sem questionar, está terceirizando sua capacidade de avaliar. Aí está o risco degenerativo.

E se isso tem a ver com pensar, tem a ver com a nossa educação.

Quais são os desafios da IA degenerativa que enxergo na educação:

Mas existe luz no fim do túnel, ou a IA vai substituir essa luz também? Sim, existe!

Para maximizar os benefícios da IA enquanto minimiza seus efeitos degenerativos, algumas estratégias podem ser adotadas:

Nem é preciso dizer que o nosso governo, Ministério da Educação e escolas públicas estão muito longe de estarem preparadas para isso. E ousaria dizer que poucas das escolas particulares estão.

A inteligência artificial tem o potencial de transformar positivamente a educação, mas sua implementação deve ser feita com cautela para evitar os riscos associados à IA degenerativa.

Ao promover uma abordagem equilibrada e crítica em relação ao uso da tecnologia, podemos garantir que os alunos não apenas se beneficiem das inovações trazidas pela IA, mas também mantenham suas habilidades cognitivas essenciais para o aprendizado significativo.

Adote, mas modere!

A solução não é abandonar a tecnologia, mas usá-la com moderação e com um olhar crítico. Experimente fazer aquele cálculo mental antes de pegar a calculadora. Memorize mais o caminho antes de abrir o Waze. Pergunte à IA, mas sempre questione a resposta. Use essas ferramentas para potencializar seu pensar, não para desligá-lo.

Afinal, o futuro pertence àqueles que sabem combinar o melhor da tecnologia com a essência do pensamento humano. E, sejamos honestos, o que seria da máquina sem uma mente humana que sabe fazer perguntas?

Não deixe a IA degenerar o seu pensar.

Vamo de manada que vai dar certo!

* Especialista de Inovação e criador do canal Elefante Limonada

Referências

Tópicos
Elefante LimonadaIA generativaInovação